sábado, 19 de julho de 2008

Cemitério de Fadas



Aqui jaz a menina dos cabelos azuis. Imóvel para a eternidade, tranqüila como o último suspiro. Nem brisa, nem tempestade. Nenhum pensamento voltou a se deslocar. Nenhum sentimento permitiu emergir. Aos poucos, ela e o mundo tornaram-se um só. A mesma consciência que abraçou para deixar de existir. Seu corpo confundiu-se com a fumaça que impedia ver, e tornou-se menos densa nos dias futuros que não viu chegar.

Desapareceu entre as gargalhadas sem rosto, os olhares sem aprovação impediram de ser quem era. Desmaio. Asfixia. Foi um sepultamento sem lágrimas no bosque do esquecimento.

Restou menos que uma lembrança. Um fiapo de luz, uma quase-esperança. Talvez não estivesse morta, era viva em essência e assim viveria para sempre. Era imortal em sua inocência.

quinta-feira, 10 de julho de 2008

Entre Paredes

As quatro paredes, suas velhas conhecidas, foram sua melhor companhia nas horas que passavam daquele dia. A cama desfeita, o telefone que nunca tocava, a mesa quase invisível por baixo dos amigos que ela permitira revisitar: os cds fora da capa, os livros fora das estante, os velhos diários fora do passado. O silêncio era quebrado apenas por uma caixa de som que emitia notas incansáveis da mesma canção.
- Talvez seja hora de mudar... - sussurram as paredes.
- Gosto da melodia. Não sei explicar, se parece comigo. - limitou-se a responder.
Uma brisa gelada entrava pela janela entreaberta e cortava-lhe o rosto. Era inverno, deu-se conta, por isso estava tudo naquele belo tom de cinza. E os toques pareciam mais gelados contra a pele. E parecia mais doce o cheiro da fumaça do chocolate-quente.
Displicente, abriu um livro em uma página qualquer.
- Lembra-se?
Sorriu ao encarar as letras. Lembrava-se. As palavras nunca mais seriam inocentes, a poesia nunca mais seria a mesma. As rimas permaneceram no papel, mudaram os olhos de quem lê.
Olhou para a página em branco do caderno à sua frente. Rendeu-se. As frases pareciam não querer ser escritas naquele dia. Havia tanto o que dizer, mas tudo no mundo parecia tão distante agora. Ela era só o que existia. A tarde tornava-se noite, sem momentos, sem instantes.